Exposição anterior:
Nuno Viegas
A de Animal
de 2011-11-05
a 2011-12-02
A de Animal remete para o início do Abecedário de Gilles Deleuze, uma série de entrevistas feita por Claire Parnet ao filósofo, filmada nos anos 1988-89, realizada por Pierre-André Boutang e produzida pelas Éditions Montparnasse, Paris.
A de Animal remete para o início do Abecedário de Gilles Deleuze, uma série de entrevistas feita por Claire Parnet ao filósofo, filmada nos anos 1988-89, realizada por Pierre-André Boutang e produzida pelas Éditions Montparnasse, Paris.
Mediante uma aproximação pessoal ao conceito, Deleuze começa por comentar o excesso de familiaridade que por vezes se atribui aos animais, sobretudo domésticos, resultante de uma forma humana de relacionamento com os mesmos, que considera redutora e assustadora. Por contraponto, mostra mais empatia pela relação entre caçador e presa como exemplo de uma forma não-humana (animal) de relação com os animais.
Este foi um dos primeiros estímulos para a minha recente abordagem, investigando sobre o quanto nessa relação é humanizado bem como o quanto acaba por nos devolver uma certa animalidade.
Na visão de Deleuze, encontramos uma crítica profunda à distinção aristotélica entre Homem e Animal por via da Razão, ao invés de pensar o Homem como único animal racional distanciando-o forçosamente dos outros animais, ele procura explorar os lugares de indescernibilidade entre ambos e aponta precisamente a arte como o expoente máximo dessa indistinção, defendendo que esta não é privilégio exclusivo do Homem, sendo uma força que antes de mais se manifesta na Natureza, estendendo-se a todas as formas de vida.
Procurei trazer os animais para esse lugar difuso, convocando-os ironicamente a participar nessa alegoria extremamente racional do homem que sem poder evitar as contingências do seu ponto de vista, os observa e interpreta através de uma linguagem, neste caso específico, a da pintura, reportando-me necessariamente para o domínio da fábula.
Ao trazer os animais para o palco da condição humana vou intencionalmente no sentido oposto ao do devir animal apontado por Deleuze. Este é o cerne da contradição e da ironia - a inescapabilidade do animal humano à sua condição, em que todo o alheamento ou ficção sobre a Natureza é também parte da Natureza.
Por outro lado, existe o gesto, a pura expressão plástica, que não deixo de entender em mim como uma pulsão animalesca de apropriação e construção do mundo, como um primeiro motor ainda despido de referências, que só mais tarde delas se apercebe e as acolhe na sua engrenagem, uma mancha que eclode antes da imagem como uma explosão anterior ao detonar da bomba.
Nuno Viegas, Lisboa, 2011
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